Crítico destaca contribuição da Editora

08/04/2011 16:20

Em artigo sobre o papel das editoras universitárias, publicado no jornal O Globo do dia 2 de abril, o crítico literário Luiz Costa Lima, um dos principais intelectuais brasileiros da atualidade, destacou a contribuição das novas publicações da Editora da UFSC para o engrandecimento da pesquisa nacional. No artigo intitulado “Crescendo sem educação”, em que se refere à importância das editoras universitárias nos Estados Unidos, Lima inclui a EdUFSC no rol das editoras universitárias de peso que participam do desenvolvimento da inteligência nacional com publicações de qualidade.

“O número é tão pequeno que foi ante meu próprio espanto que recentemente descobri que àquelas poucas deveria se reunir pelo menos mais uma, a da Universidade de Santa Catarina, por onde saíram em 2010 uma excelente coletânea de textos em prosa de um autor difícil como Mallarmé (Divagações, tradução e apresentação de Fernando Scheibe) e, já neste começo de ano, um livro que combina um ensaio pouco conhecido de Giorgio Agamben sobre o poeta italiano Giorgio Camproni, com uma antologia bilíngue de Camproni, em obra organizada e traduzida por Aurora Fornoni Bernardini”, escreve o crítico. Nesta sexta-feira, 8, a Editora lança Uma teoria da adaptação, obra inédita de Linda Hutcheon, teórica literária canadense reconhecida como uma das maiores especialistas em literatura na pós-modernidade, traduzida por André Cechinel, recém-doutor em literatura pela UFSC. Veja o artigo de Luiz da Costa Lima na íntegra:

|Crescendo sem educação’, por Luiz Costa Lima (publicado por O Globo em 2/4/2011)
Há muitos anos o Brasil foi chamado de terra de contrastes. Seria retórica barata perguntar se isso continua verdadeiro. É claro que sim, e mais: ao contraste antigo — a extrema diversidade da riqueza de uns poucos e a miséria de milhões — acrescentaram-se muitos outros.

Não me proponho tratar senão de um: ao passo que se fala na melhoria da condição financeira de parcelas até então miseráveis da população e da balança de pagamentos do Estado nacional, correlatas ao incremento do parque industrial e ao aumento das possibilidades de emprego, ressalta-se menos que nosso sistema educacional passa de mal a pior, desde o nível mais elementar até o acadêmico. (E como poderia ser diferente, considerando a má remuneração dos professores, suas condições de trabalho, seu consequente baixo status na sociedade e a carência das bibliotecas?) Pergunta que surge de imediato: como sustentar o leque ampliado de empregos sem que haja melhoria do nível de profissionalização? A resposta convincente não pode ser outra: o maior número de empregos é preenchido no plano que exige pequena ou ínfima profissionalização.

E como se fará com as tarefas que necessitem de profissionais bastante especializados? Há de se fazer de conta que são atividades que não interessam ao desenvolvimento do país — que são elitistas(!), ociosas ou necessárias apenas nos países que já resolveram seus problemas básicos — ou, se for inevitável, contratam-se técnicos estrangeiros (na verdade, embora disso pouco se fale, as duas estratégias já são bastante praticadas).
No entanto, mesmo que esse seja tão só umas das faces dos nossos novos contrastes, ele é muito vasto para o espaço de um artigo, tivesse o tamanho duplicado. Procuro ajustá-lo a meu tamanho, tratando do nível da questão que mais bem conheço: o do ensino universitário. Para que possa ser mais incisivo, condensando-o em uma questão: como a universidade pode cumprir sua tarefa sem que, em seu conjunto nacional, disponha de um número adequado de editoras de qualidade? Será preciso explicar o porquê da pergunta?

Na dúvida, em lugar de um raciocínio abstrato, recorro a um caso concreto. Não vejo outro melhor do que o do país por excelência do capitalismo liberal: os Estados Unidos. Qualquer pessoa que tenha de lidar com revistas e livros especializados, sabe da absoluta importância assumida pelas editoras universitárias norte-americanas. Não há nenhum mistério em que seja assim. Em um regime capitalista, a exigência da mais-valia pesa de igual sobre suas instituições e, assim, também sobre suas editoras comerciais. Os Estados Unidos contrariariam o espírito do capitalismo e sua tradição pragmática se suas editoras universitárias estivessem isentas de se preocupar com as respectivas receitas; ou se fossem instituições “benevolentes”, apenas colaboradoras dos amigos dos chefões, adeptas do nosso compadrio. É o próprio raio da extensão dos cursos, laboratórios e centros de pesquisa que as universidades acolhem que delas exige um número qualitativamente elevado de publicações; assim como bibliotecas extremamente bem aparelhadas.

Ora, se usarmos entre nós o mesmo raciocínio chegaremos a um resultado que pareceria impensável: embora eu não saiba quantas universidades temos, sei bem do número ínfimo de editoras universitárias de peso. Mesmo sob o risco de esquecer alguma ou, certamente, de não poder fazer justiça ao esforço de uns poucos — como é o caso da atual direção da Editora da Uerj, contra a inércia dominante — recordaria as editoras da Universidade Federal de Minas Gerais, da USP, da Unicamp, da Unesp. (É possível que não haja outras mais?!) O número é tão pequeno que foi ante meu próprio espanto que recentemente descobri que àquelas poucas deveria se reunir pelo menos mais uma, a da Universidade de Santa Catarina, por onde saíram em 2010 uma excelente coletânea de textos em prosa de um autor difícil como Mallarmé (“Divagações”, tradução e apresentação de Fernando Scheibe) e, já neste começo de ano, um livro que combina um ensaio pouco conhecido de Giorgio Agamben sobre o poeta italiano Giorgio Camproni, com uma antologia bilíngue de Camproni, em obra organizada e traduzida por Aurora Fornoni Bernardini.

Como é possível tamanha carência? Explicação possível: nas chamadas ciências “duras”, seus especialistas empenham-se em escrever pesquisas ou recém-acabadas ou em andamento, ao passo que os livros, identificados com os “manuais”, têm pouca importância. Mais ainda: tais pesquisas cabem em artigos que, segundo os critérios dos nossos conselhos de pesquisa, devem preferencialmente estar em inglês e serem publicados em revistas de prestígio reconhecido. Ora, essas não são nossas. Portanto não faz falta que não haja editoras nacionais. Mas e as humanidades? Nessas, os livros continuam decisivos. Devemos publicá-los também em inglês? Mas não compliquemos. Os que se dedicam a elas devem considerar o nível não especializado de nosso público. Portanto seus livros ou cabem em uma editora comercial ou são dispensáveis. Não sei se a explicação é correta, mas pelo menos faz sentido.
LUIZ COSTA LIMA é crítico literário, autor de “O controle do imaginário e afirmação do romance”, entre outros
Raquel Wandelli (37219459 e 991105240 – assessora de Comunicação
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