Peninha lança autobiografia e narra os casos e ocasos raros do litoral de Santa Catarina

17/03/2019 09:50

Em Narrativas absurdas: verdades contadas por um mentirosoGelci José Coelho (Peninha), multiartista, pesquisador, museólogo, conhecido guardião das tradições das culturas populares do litoral de Santa Catarina, nos traz um texto mágico (que dúvida!) que mescla sua história de vida com lendas, contos e casos raros.  O livro narra a trajetória do artista desde suas primeiras lembranças quando ainda estava no útero de sua mãe, e cobre da infância aos dias atuais em que vive a aposentadoria na encantada Enseada de Brito.  Um tesouro de literatura de realismo mágico e um belo registro da cultura popular e, especialmente, da cultura pop dos tempos do Studio A2 de Beto Stodieck e Luis Paulo Peixoto – com quem trabalhou-; do Palhostock e da cena artística da Ilha nos anos 1970.

Além de grande artista Peninha foi fiel seguidor do mestre Franklin Joaquim Cascaes, genial artista brasileiro que realizou o maior e mais significativo registro das culturas populares do litoral de Santa Catarina, cuja obra está escondida no Museu Universitário da UFSC.   Peninha trabalhou com Cascaes por mais de uma década.

O livro será lançado no dia 21 de março (quinta-feira), às 19 horas, em evento no Museu da Escola Catarinense (MESC), em Florianópolis, com sessão de autógrafos, performances artísticas e a abertura da exposição Um boitatá em dois tempos, com registros fotográficos de Biah Schmidt de duas diferentes fases da vida de Peninha. A iniciativa conta com o apoio das empresas WKoerich, Box 32 e Escritório de Comunicação; do MESC e da Fundação Franklin Cascaes.

Realismo mágico

“Narrativas absurdas: verdades contadas por um mentiroso é um texto autobiográfico que mescla o testemunho da experiência vivida com o olhar fugidio da imaginação que se lança sobre a memória quando então tudo se mistura: realidade, ficção, poesia, espanto, tragédia e assombração, no melhor que o realismo mágico, enquanto gênero literário, pode oferecer”, resume Bebel Orofino, roteirista e escritora que assina a edição da obra junto com o autor.  Grande amiga de Peninha e autora de projetos importantes como a minissérie Ilha das Bruxas, o espetáculo teatral Catharina, uma ópera da Ilha e o livro Vozes da Lagoa, foi dela a ideia de transformar o manuscrito em livro, incentivando-o à publicação.

“A mitologia da Ilha de Santa Catarina é sensacional.  E pouco se fala sobre isso.  Santa Catarina é o único estado do Brasil onde se encontram narrativas mágicas únicas, surreais, com seres sobrenaturais próprios – em especial, as bruxas e os bruxos e suas estripulias. E, é claro, a proteção das poderosas benzedeiras e dos benzedores, com suas rezas, amuletos, breves, ervas e receitas infalíveis”, reforça Bebel Orofino.  E acrescenta: “Se engana que pensa que só há bruxas!” E cita asoutras personagens incríveis como: boitatás, vacatatás, ondinas, sereias, lobisomens, vampiros, mulas-sem-cabeça, fantasmas, visagens, almas em procissão entre outros seres do mundo sobrenatural. “E este livro do Peninha fala de tudo isso com sotaque local. Não há dúvidas de que é um dever nosso a publicação e a difusão destas histórias que guardam a alma da nossa cultura popular”, enfatiza.

O prefácio

A diretora e professora de teatro Vera Regina Collaço assina o prefácio do livro. “Sinto-me privilegiada de conviver e conhecer esse ser bruxólico, den­goso e doce que ele é. Uma pessoa rara, que tem o dom da narrativa mágica e histórica e que é um porta-voz da cultura do nosso lugar”, destacou, em seu texto, Vera Collaço, que trabalhou com Peninha no teatro nos anos 1970.  Atualmente, Vera é professora de graduação e nos cursos de mestrado e doutorado em teatro do PPGT/CEART-UDESC.

O livro

Narrativas absurdas: verdades contadas por um mentiroso (Santa Editora, 2019) tem 200 páginas, formato 16X23cm e está organizado em seis capítulos. Está fartamente ilustrado com pinturas e desenhos do artista e com uma coleção fotográfica de Biah Schmidt, que mostra o artista nos anos 1970 e nos dias atuais. A obra será comercializada a R$ 45,00, no local do evento de lançamento e, após, com exclusividade, nas lojas e pelo site das Livrarias Catarinense.

O autor

Nascido em São Pedro de Alcântara, em 10 de agos­to de 1949, Gelci José Coelho, o Peninha, é um dos guardiões da história, memória, cultura e arte de Santa Catarina. Cresceu e viveu em São José até bem pouco tempo, quando se mudou para a encantada Enseada de Brito, em Palhoça, onde mora até hoje.

Com formação em História e Museologia, ele trabalhou desde os 21 anos de idade até a aposentadoria na UFSC junto ao Museu de Arqueologia e Etno­logia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral – MArquE.  Nesta instituição atuou em pesquisa, guarda de acervo, exposição, gestão em mu­seologia até chegar ao cargo de Diretor do Museu, em 1996, no qual permaneceu até se desvincular da instituição, em 2008. Trabalhou com o artista, folclorista e pesquisador Franklin Joaquim Cascaes por mais de uma década, quando foi seu assistente e aprendiz.

É artista plástico, perfomer, ator, dramaturgo, produtor de instalações urbanas como o Presépio Natural e Artesanal da Praça XV de Novembro no centro de Florianópolis, etc. É um incansável apoiador e consultor para toda ati­vidade cultural ligada à herança dos açorianos, dos descendentes das nações africanas e indígenas que habitam o nosso litoral.

É um grande contador de histórias. Dentre as lendas de sua autoria, a mais famosa é a do Baile das Bruxas em Itaguaçu. As icônicas pedras da praia no bairro de Coqueiros, na parte continental de Florianópolis, seriam bruxas que foram petrificadas por não terem convidado o diabo para a grande festa que promoveram ali. A lenda já faz parte do repertório cultural da região e foi devidamente reconhecida pelo poder público municipal, que a registrou em uma placa de ferro fixada no local. As ‘Pedras de Itaguaçu’ foram tombadas como Patrimônio Natural, Paisagístico e Cultural do Município em 2014.

A exposição Um boitatá em dois tempos

As fotos de autoria de Biah Schmidt registram o cotidiano de Peninha em dois momentos diferentes. O primeiro registro, realizado durante o período Flower Power ou desbunde tropical, como narrado no capítulo 4 do livro, recupera a ousadia vanguardista do autor/artista.  Um conjunto de mais de 15 fotos em preto e branco trazem a força e a potência criativa de um artista se abrindo para o mundo a partir da efervescência da cena artística e cultural da Ilha de Santa Catarina nos anos 1970.  As imagens recuperam a autoria do artista em seu jeito de ser:  diferente, irreverente, sensual e provocador em seu jogo de corpo.  Sim, Peninha ajudou a mudar o mundo e isso já 50 anos atrás, quando começou sua carreira como ator, dramaturgo, performer, artista plástico e criador de instalações urbanas.

O segundo momento, em 15 fotos coloridas, nos mostra o Peninha escritor, mais calmo, sossegado, delirando livremente na encantada Enseada de Brito.  Estas imagens mostram o autor dos casos raros narrados no capítulo 6 do livro que falam desse período mais recente de sua vida quando ele finalmente conseguiu parar para escrever e nos contar como acontece o encontro noturno com um boitatá cabriolante.  Peninha mora hoje em uma clássica freguesia açoriana do nosso litoral e em uma casa colonial “de três janelas de frente” construída pelos anos de 1780.  É quando ele então se transforma em personagem das narrativas mágicas do nosso lugar ao registrar os casos raros que presenciou ao longo de sua vida.

O fotógrafo

Biah Schmidt, outro grande amigo do Peninha, foi o “fotógrafo oficial” do artista nos anos 1970.  “Eu admirava muito o Peninha, a pessoa dele, o grande artista, a irreverência, a casa dele – aquela geodésica louca -, então tomei a iniciativa de fotografar o seu cotidiano.  Foi maravilhoso encontrá-lo agora, em 2018 na encantada Enseada como ele próprio se refere, para repetir a experiência”, comenta Biah Schmidt.

Natural de Florianópolis, Biah Schmidt está radicado em São Paulo (SP) há algumas décadas onde atua como diretor de arte da revista Monet, da editora Globo. Ele é autor de fotos emblemáticas do período de maior efervescência cultural em Santa Catarina, nos anos 1970 e 1980. São registros que enaltecem os atores, os personagens, as personalidades e fatos marcantes da época e que valorizam a arte, a cultura e o patrimônio.

A editora

Santa Editora, comandada pela jornalista Letícia Wilson, investiu neste projeto porque acredita na potência e na riqueza das narrativas originais de Santa Catarina.

No mercado editorial de Santa Catarina há uma década, a editora decide abrir espaço para as publicações que valorizem e recuperem as narrativas originais – da memória popular ao contemporâneo – dos autores catarinenses.  “Eu tenho um amor particular pelas narrativas locais e me encanto ao ouvir as histórias sobre as lendas e sempre quero conhecer mais. Por isso, acreditei nesse projeto e me sinto honrada de poder colaborar com um projeto autoral do nosso querido Peninha”, destaca Letícia, que convidou a designer gráfica Andrezza Nascimento para a composição gráfica da obra. Com este livro, a editora pretende abrir um caminho para a recuperação, valorização e difusão das mágicas narrativas do litoral do nosso Estado.